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Mumford and Sons: inspiração ou apropriação?

Você é um artista novo e caiu na graças do público desde o seu primeiro disco. O seu nome aparece em destaque nos grandes festivais no calendário mundial, qualquer álbum de sua discografia tem como lugar cativo o primeiro lugar da Billboard ou UK Charts e sua base de fãs aumenta a cada dia. Este é o cenário que qualquer banda gostaria de ter e é o que o Mumford and Sons tem atravessado nos últimos anos. Parece uma vida bem bacana, mas por que não quebrar a rotina e se arriscar um pouco? Eles lançaram um disco conceitual na última semana que serve de reflexão sobre o que um artista no mainstream pode fazer no auge de sua carreira.

Eu já fui para alguns festivais onde eles tocaram e também ouvi alguma coisa ou outra deles em alguma playlist. Não acho ruim, mas o sentimento que tenho pelos últimos trabalhos é de ouvir uma trilha sonora de comercial de banco. Acho que os publicitários brasileiros gostam muito do Mumford and Sons e querem ter algum som parecido nas campanhas que realizam para a sua agência. O disco mais recente deles, ‘Wilder Mind’, foi lançado no ano passado e foi muito bem em vendas. Parece que isso não foi o suficiente para a banda inglesa. Em vez de continuar na turnê, ganhando o seu dimdim e desbravando países pelo globo, o Mumford and Sons decidiu parar e fazer algo diferente. Marcus e seus companheiros de banda zarparam para a África gravar algumas composições que estavam na cabeça deles há algum tempo. Realizar esta ruptura para qualquer artista grande é louvável.

Para conceber o ‘Johannesburg’, eles ficaram dois dias imersos num estúdio improvisado com artistas de primeira linha relacionados com a música africana. Eles contaram com a participação do coletivo londrino-malawi The Very Best, da lenda senegalesa Baaba Maal e da banda sul africana Beatenberg. Eles já tinham deixado de lado os banjos e suspensórios em ‘Wilder Mind’, para abraçar guitarras e sintetizadores meio anos 1980. O que esta trip poderia proporcionar para o som da banda? Esta viagem rendeu cinco músicas (para quem já ouviu, deve ter ficado com o desejo de ouvir mais algumas), uma exposição de fotos intimistas, um documentário supimpa que será lançado até o fim do ano e uma pergunta: Se o meu artista favorito fizesse algo deste tipo? Imagina se a Rihanna fizesse uma pausa em sua turnê para gravar um disco de dancehall em seu país natal?

Eu achei muito interessante o tom do grupo sobre a realização deste trabalho. Em entrevistas, eles apontam que era a hora certa e tinham as pessoas certas para gravar este mini-album. Para quem estava acostumado com o folk engomado de refrão pegajoso, as músicas podem causar certa estranheza, mas eles parecem não dar importância sobre esta fusão com batidas e instrumentos genuinamente africanos. A resposta sobre a rejeição dos fãs e críticas pesadas é a mesma. ‘Nós ignoramos todo este barulho’. A ideia deles é sempre serem curiosos musicalmente e tentar coisas diferentes.

Este trabalho do Mumford and Sons teve um impacto imediato para todos os grupos que participaram do mini-álbum. Por exemplo, as canções mais populares de Baaba Maal, The Very Best ou Beatenberg no Spotify já são as de ‘Johannesburg’, lançadas na última sexta-feira. Se 10% dos fãs do Mumford and Sons tiverem o interesse e ir atrás de mais músicas de algum artista do EP ou ir em um show, vão fazer uma baita diferença em suas carreiras.

É um argumento interessante de Marcus Mumford de tentar coisas diferentes com o seu grupo. Por que não resgatar grupos que tem um pé na África e colocar em suas composições? O Sting fez isso no Police. Os Paralamas do Sucesso fizeram isso. Joe Strummer fez isso no The Clash. Elvis Presley fez isso em toda a sua discografia. Legal, certo? Batendo um papo com amigos sobre o resgate desta cultura no álbum, um deles parou e falou: mas isso é apropriação cultural, cara. Eu não concordei e citei as bandas no parágrafo. É algo complicado falar sobre apropriação cultural na música, mas achei interessante este ponto de vista dele. Acho que o papo poderia ser diferente se o Mumford and Sons começasse a tocar com batas, pinturas características e turbantes no restante de sua turnê. Isso é errado e proibido? Não, de maneira alguma.

“Por que eles não podem tocar com o turbante? Eles ficam tão bonitinhos! É tendência…”

Neste caso falar sobre apropriação cultural pode servir. Por que? Por mais que eles ficaram emergidos na cultura africana por alguns dias, não dá para colocar elementos africanos que tem um grande significado apenas por modismo. Ah, e outra coisa: apropriação cultural não serve apenas para cultura negra. Se eles gravassem um disco com elementos hindus e fizessem como a Selena Gomez também não pegaria bem.

‘Johannesburg’ não vai fazer com que o Mumford and Sons lance apenas músicas que flertam com elementos africanos, calma. Se a ideia deles é sempre buscar novos elementos para as cantigas de folk que eles estão acostumados em fazer, o trabalho cumpre com o seu papel. Eles utilizam uma expressão em francês na última canção do mini-album que resume bem o que o espírito das composições. Você pode participar desta nova fase, ‘Si Tu Veux’ (Se Você Quiser).


O jornalista paulistano, produtor musical e marketeiro Brunno Constante analisa, pondera, escreve e traz novidades sobre música no Papelpop todas as terças-feiras.

Fita Cassete é o alterego de Brunno quando ele fala sobre o assunto.

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* A opinião do colunista Brunno Constante não necessariamente representa a opinião do Papelpop. No entanto, por aqui, todas as opiniões são bem-vindas. :)

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