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Projeto Aqueenda revela o outro lado de drag queens brasileiras

Alexia Twister

Para mostrar que drag queens são muito mais do que uma boa maquiagem, carão ou ou figurino surgiu o Projeto Aqueenda, cujas fotos estão fazendo sucesso no Instagram @projetoaqueenda. Drag lover desde a adolescência, a fotógrafa e designer de moda Jal Vieira sempre quis fazer algum trabalho relacionado a esse universo.

Alexia Twister

Foi em 2014 que abraçou essa paixão e passou a registrar o outro lado de performers em fotos. Já foram registradas por suas sensíveis lentes nomes como Alexia Twister, Márcia Pantera, Ikaro Kadoshi, Malonna, Deendjers, Rita von Hunty, Musa e Hidra Von Carter, entre outras. Futuramente o projeto irá virar um documentário e depois exposição e livro.

Leyllah Diva

“Quando fotografo drag queens, vejo muito mais que purpurina, glitter ou plumas. Vejo poesia! Vejo arte! Na maneira de se maquiar, no olhar lançado a cada um na plateia, no figurino, na destreza em fazer o público esquecer que por trás daquela imagem feminina, existe um homem de fato”, disse a fotógrafa. Ela fala mais sobre o Aqueenda em primeira mão ao Papel Pop:

Deendjers

Como surgiu a ideia do projeto Aqueenda?
Há cerca de 6 meses, conversando com uma antiga parceira, decidimos fazer um trabalho que desmistificasse a idéia distorcida que algumas pessoas acabam formando a respeito da arte drag, e que isso resultasse em um livro. Algumas coisas mudaram durante o percurso, como o rompimento da parceria, e a idéia de expandir ainda mais a linguagem. Achava importante não só fotografar, me parecia necessário registrar por meio de uma linguagem audiovisual, mais precisamente, um documentário. As filmagens ainda estão sendo planejadas mas as fotos já estão sendo produzidas.

Ikaro Kadoshi

O que você pretende mostrar com esse trabalho?
O que o projeto busca mostrar desde o seu início são os grandes seres humanos que dão vida à essas drag queens. E esclarecer às pessoas que esses homens não querem ser mulheres. Aliás, estão muito bem com seu corpo masculino. Esses homens querem mostrar que mais do que uma arte que exige trabalho árduo para estar todas às noites no palco, encantando o nosso olhar com beleza, inteligência e perseverança que possuem, buscam ali não somente aplausos. Eles lutam todos os dias para serem respeitados e terem a sua arte reconhecida.

Stripperella

E como está sendo o desenvolvimento do projeto?
Tenho registrado em todos os finais de semana o universo drag queen. Mas não somente o que todos conhecem: em baladas. Acompanho esses artistas em seu dia a dia, em casa, na casa de amigos, em ambientes que não estamos acostumados a vê-los. Além disso tenho tido a oportunidade de conhecer, todos os dias, os criadores dessas personagens. Homens que possuem trabalhos como o de qualquer outra pessoa. Que têm contas e deveres a cumprir. Que pegam metrô, que andam a pé, que têm problemas, além de grandes alegrias.

Kelly Caramelo

O que mais chamou sua atenção durante as transformações?
Enquanto estão se maquiando, a maioria delas ainda está fora do personagem. Quero dizer, enquanto essência, mesmo. À medida que esse processo de transformação vai avançando, se começa a perceber como a personagem vai chegando e tomando espaço naquele corpo. Quando o último item, a peruca, é colocado, temos a sensação de que ali se atravessou um portal. A partir desse momento a voz muda; os gestos ficam mais femininos; o olhar reluz mais; a postura se torna mais cuidadosa e, quase não é possível notar que, há minutos atrás, estávamos conversando com um rapaz.

Danny Colwt

E durante as performances? Algum dos artistas transforma radicalmente sua personalidade?
Quase nunca percebo a presença do criador enquanto a drag queen está ali presente. Mas existe, sim, uma drag queen que me chocou absurdamente na completa diferença de personalidade entre o indivíduo masculino e sua drag: Danny Cowlt. Conheci a Danny ainda nos palcos. Não tinha nenhum contato pessoal com ela, até então. A figura dessa drag é extremamente avassaladora. É impossível desgrudar o olhar dela enquanto está no palco ou mesmo quando passa por você. Figura marcante, forte, de olhar impactante e maquiagem que quase beira a intimidação de tão sombria e misteriosa. Sempre me pareceu que, o homem por trás daquela personagem fosse tão assustador quanto.

Quando enfim conheci o Flávio, criador da Danny, não conseguia acreditar na docilidade daquela pessoa. Fui cumprimentá-lo com um pouco de receio de estar invadindo algum espaço, então me mantive um pouco distante. O Flávio, me vendo mais quieta, se aproximou e me disse: “Vem aqui! Deixa eu te um beijo”. Depois disso, imagine a minha reação. Completo encantamento e respeito. O que mais me encanta nesses artistas é a completa generosidade. Coisa rara de se ver hoje em dia.

Malonna

Há alguma história interessante que a marcou ao longo do projeto?
Quando o assunto é drag queen, há sempre histórias incríveis! Existe uma que me marcou muito. Prefiro não comentar com quem foi pelo fato da história ser mais delicada e pessoal. Mas, uma das drag queens que entrevistei contou que, em uma fase de crise, se envolveu com drogas. Acabou se viciando e em um dia de uma quase overdose sentiu que estava prestes a morrer. E, naquele momento, além do pensamento em si e na sua família, o que a fez levantar e se reerguer foi pensar que sua personagem ainda tinha muita história pela frente e que não poderia acabar com isso por conta de um vício. Então, largou as drogas. A frase final dela me marcou de uma maneira quase inexplicável. Ela disse: “O que me salvou foi a minha personagem. Não fosse por ela, provavelmente, eu não estaria mais aqui”.

Isso me fez pensar que, a drag queen não é apenas uma personagem que esses homens incorporam à noite. A drag queen é também o que aquele individuo é e respira. O que o ajuda a se movimentar todos os dias.

Marcia Pantera

Você pretende fazer alguma exposição ou lançar um livro com as fotos?
Sim. A exposição é uma idéia efetiva do projeto. Provavelmente, se antecipando ao documentário. Mas acredito que esse resultado venha a longo prazo, pois pretendo criar um acervo por, no mínimo, um ano acompanhando esses artistas. Mas a idéia de uma exposição fotográfica do projeto está, com toda certeza, nos meus planos. Além disso, penso, sim, em um livro. Porém, é muito provável que este seja fruto da exposição e do documentário.

Confira mais imagens:

Alexia Twister

Rita Von Hunty

Hidra e Musa VonCarter

Pra acompanhar o lindo trabalho de Jal Vieira siga o seu Instagram @projetoaqueenda.

* A coluna Drag Queens do Papelpop é feita por Flávia Durante, jornalista e DJ em São Paulo. Ela é do tempo da sigla vintage GLS e divide sua vida em Antes-RPDR e Depois-RPDR. Blog www.flaviadurante.net.